Boa Diversão

Sábado, véspera de feriado, dia 11 de outubro, 22h40... Ao chegar em frente a lona futurista do remodelado Circo Voador, na companhia de minha namorada, e os amigos – o produtor musical André Gomes, sua esposa Hannah Lima e o rapper angolano Nelboy Dastha Burtha – notei um formigueiro de pessoas advindas de vários cantos do rio, agitando-se do lado de fora na intenção de adquirir rapidamente o seu ingresso para prestigiar talvez um dos eventos mais autênticos da cultura hip-hop carioca: o Hip-hop Voador! Os olhares óbvios daqueles que, de alguma forma, faziam parte do movimento carioca, se misturavam junto a outros de expressão curiosa, devido o primeiro contato com o hip-hop nacional naquele momento. Pessoas que, talvez pela frustração de alguns shows importados, queriam acreditar em um hip-hop mais original. E foi esta originalidade que conotou o ponto de ebulição do evento, sendo o Hip-hop Voador marcado no seu total por artistas anônimos as vistas da grande mídia...

22h45, adentrando ao backstage do evento, reencontrei companheiros da antiga escola, que se fundiam entre os mais modernos em um clima de harmonia sem igual. Estava lá Carinhos N@tty Dread, um amigo da região de Alcântara que na época das vacas magras do movimento, era a pessoa que estampava uns desenhos e mensagens conscientes afim de que pudéssemos afirmar a nossa posição na sociedade e ter sem mão um visual arrojado. A rapper Edd Wheeler, líder do primeiro grupo de rap feminino carioca, o extinto Damas do Rap também esteve presente dando um apoio moral às novas irmãs do hip-hop...

Como uma verdadeira ´jam party`, seguindo as tradições do hip-hop, a manifestação simultânea dos principais elementos do hip-hop se fez presente no espaço dividindo assim a atenção e matando a curiosidade do público: rodas de b. boys, murais de graffiti e performances de djs interagiam a todo vapor no espaço externo, rente a lateral da lona, inibindo o atraso técnico da apresentação dos rappers no palco. A respeito das apresentações dos b. boys, grafiteiros e djs, percebi, mesmo que ainda sumária, a adesão da figura feminina, que, diga-se de passagem, em minha época era algo extremamente raro...

Ao deslumbrar-me com a exposição de graffiti que ali se formava movida pela criatividade freestyle dos nossos writers, de repente me deparo com Paulo, um dos poucos grafiteiros, e, quem sabe um dos pioneiros da “spray canart” dos anos 90 no Rio. Paulo havia me dito que tinha deixado o grafitti para dedicar-se as pinturas das galeria, mas sem perder as influências urbanas...

23h47, com um atraso natural de mais de 1 hora, os primeiros artistas ganham o palco democrático do Circo dando inicio a bio-diversidade de estilos do hip-hop carioca...

Dentre tantas concepções musicais ali apresentadas, o grupo gospel Manuscritos, com sua verbalização underground, além de ter conquistado o quesito originalidade, trouxe a todos a Mensagem de Deus através do seu som. 44 grupos se apresentariam ainda naquela noite, e para suprir o contratempo previsível, duas mesas de djs revezavam-se simultaneamente afim de que a programação não sofre-se buracos, o que causou o delírio da platéia que se nutria dos 5 preciosos minutos de cada artista...

Retornando ao backstage, me deparei com o velho amigo King Nino Brown, representante das organizações Zulu Nation Brasil, Posse Hausa e Casa do Hip-hop de Diadema-SP. Nino se mostrava entusiasmado com o crescimento da cultura no Rio e iniciativas como aquela. No mesmo local, tivemos o prazer de conceder uma entrevista para o material de divulgação da entidade Olhares do Morro, aonde seu representante e amigo, Vítor Cunha, expunha em telão o trabalho de sensibilização fotográfica do cotidiano das favelas do Rio àqueles que ainda desconheciam esta realidade... Em dado momento, o rapper Vinimax é anunciado, e juntamente com a minha dama, retorno a pista para prestigiar o amigo, que ao contrário a impressão de muitos é um contemporâneo a nossa antiga escola...

01h15, Hannah Lima sobe ao palco, e a sua frente, uma espécie de arrebatamento popular ocorre. Como um misto de curiosidade e admiração, muitos, tanto do hip-hop, quanto que do público formador de opinião, se concentram a frente do palco, afim de tirar a teima da dúvida de seu trabalho: r&b-hip-hop-soul na veia que contou com as participações inusitadas dos djs Saddam, ´A`, o baixo inflamado de André Gomes, o rap da Terra Mãe de Nelboy e o reforço vocal das nostálgicas Damas do Rap. Algum tempo depois, o palco é tomado novamente por figura quase que mitológica para a nova geração do hip-hop carioca: o peso vocal de Nelboy Dastha Burtha! Comprovado! Realmente era algo extremamente esperado, se considerarmos os inúmeros comentários advindos da platéia que não conseguia desviar a atenção das performances bem colocadas do rapper, que, ao finalizar seu show, discursou em tom cortante e reflexivo a postura duvidosa de muitos de nossos ´mcs freestyllers`... Fogo! Fogo! Chamem os bombeiros!

Narrar todos os acontecimentos da 2a edição do Hip-hop Voador, certamente resultaria em algo próximo a um livro-tese. Portanto, encerro este texto deixando um salve a todos aqueles que, direto ou indiretamente, proporcionaram o acontecimento de um evento, que além de ter aberto mais um espaço para as gerações do hip-hop carioca, demonstraram também que o “monopólio” em nosso meio é algo combatível:

Salve DJ Saddam, Vinimax, Elemento Surpresa (b.boys), Macarrão, DJ Euza, Anastácias, Instinto Coletivo (b. boys), Don Negrone, Luana Delstyle, Kapella, Manuscritos, DJ ´A`, Veredito do Gueto, Negre Soul, Archanjo, N’atitude Mc`s, GBCR (b. boys), DJ Arthur, Jigga-Man, Noemia Duque, Periff Break, Maninha, DJ Michel, Rapdeaaz, DJ LP, OE. Hip-hop com Fé, Contenção, Kwanza, Atari Funkers (b. boys), DJ Claudia, Manos S/A, Aliados 021, IDR (b. boys), DJ Sandra Santos, Peixota, Ger’ arte (crew), Expresso Hp, Moechock, Márcia 2 Pac, A Força, Estilo Livre (b. boys), DJ Marcelinho MG, Subversus, Baixada Break Boys, Desabafo Urbano, Bideli, DJ Fabinho, Negberto, Queen, DMT, DJ Renato RB, Fator 4 (b. boys), Mr. Buke, Comanche, Fiell, Raimundeco, Impacto Break, Mc Dicley, Cobá, Bolt, DJ Logri, Marechal, Agno Dinamite, Bob X, Edd Wheeler, DJ Typa, Descendentes da Ralé, DJ Rosane Estrelinha, Nino Brown, Nove Balas, PH2 (b. boys), Olhares do Morro, DJ Tamempi Menezes, DuGuettu, Posse DAPC, DJ Juan, Maré Break, CJ Hip-hop Cia (posse), Soul Train (soulmen), Nação Graffiti, Thogun, Marion Monteiro, Hannah Lima e Nalboy Dastha Burtha.

Até a próxima com certeza!