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Cidade de Deus, o conjunto habitacional que marcou época na história do cinema brasileiro, está prestes a retornar às telas da Sétima Arte, só que agora através de “CDD 50 Anos”, documentário em tributo ao cinqüentenário do bairro que nasceu após a enxurrada de 10 de janeiro de 1966...
200 mortes, cerca de mil desabamentos em várias localidades do Rio e mais de 30 mil desalojados; este foi o relatório noticiado pela imprensa da época, depois do decreto estado de calamidade pública na cidade, feito pelo então governador Carlos Lacerda. Parte pertencente de Jacarepaguá, a Cidade de Deus, nome carinhosamente batizada por Dom Hélder Câmara (recém-nomeado na época a Arcebispo das cidades de Olinda e Recife) em 1964, quando Carlos Lacerda possuía a pretensão única de alojar na área funcionários do setor de construção civil da COHAB-GB – Companhia de Habitação Popular do Estado da Guanabara e suas famílias, para o plano de prestação de serviços no desenvolvimento da Barra da Tijuca, esteve sujeita às mudanças bruscas de planos...

No 1º de março de 1966, já no então Governo Negrão de Lima, famílias advindas da Baixada Fluminense, e de favelas removidas das zonas Sul – Praia do Pinto, no bairro de Leblon; Macedo Sobrinho, no Humaitá; Morro da Catacumba, na Lagoa (área reflorestada onde atualmente está localizado o Parque da Catacumba) – e Norte, como foi o caso do Esqueleto (onde funciona desde então o campus da UERJ), foram transferidas para a Cidade de Deus contabilizando cerca de cinco mil casas construídas entre os dois governos. Ao todo, foram 63 favelas removidas por inteiro ou parcialmente, como foi o caso do Parque Proletário da Gávea e Rocinha, existentes em seus locais de origem até hoje.

Dirigido por DJ TR, Mateus Paz, e Bruno Rafael, alunos do curso extensivo universitário de cinema do Centro Loyola PUC – Rio, e Paulo Silva (diretor de Enchente, documentário produzido em 2011 por ele e o saudoso Julio Pecly sobre a devastação cauda pelas chuvas de 1996 na Cidade de Deus), CDD 50 Anos pretende revelar uma comunidade ainda a ser descoberta pelo morador mais jovem, descrita (inicialmente) pelos primeiros habitantes do bairro, como explica DJ TR:

“Naquela época, a CDD não estava projetada para atender a grande demanda de desabrigados pela enchente de 66. Este crescimento desordenado gerou conflitos internos, despertando hostilidade e territorialismo em alguns moradores recém-chagados das muitas favelas removidas e devastadas pelas chuvas, por conta da precariedade dos recursos básicos de sobrevivência. O que talvez explique melhor o episódio do confronto épico entre “Mané Galinha” e “Zé Pequeno”, abordado no filme Cidade de Deus”, analisa.

Mateus Paz atenta também para questões de suma importância na organização social da CDD:

“A figura extraordinária do saudoso Pe. Júlio Groten, promoveu ações sócio-culturais voltadas para a inclusão do morador em plena ditadura militar. Talves ele tenha sido um dos precursores da tolerância religiosa na CDD, brinca. Ele não fazia acepção à confissão religiosa de cada morador. O gol improvável da intermediária de Josimar contra a Irlanda, na Copa de 86, numa cruzada de ângulo que garantiu a classificação do Brasil no primeiro grupo. Isso demonstra que temos um passado digno do nosso orgulho”, afirma.

Bruno Rafael destaca a Cultura e a Literatura como fatores de grande relevância no bairro:

“95, o Rap da Felicidade de Cidinho e Doca, se torna o hino de todas as favelas do Rio. 97, os Racionais MCs fazem seu primeiro show em uma favela no estado. 99, MV Bill chama a atenção da sociedade no palco do Free Jazz Festival, substituindo a pistola na cintura por um microfone durante a canção Soldado do Morro. 2001, a Globo exibe o curta Palace II, revelando a dupla Laranjinha e Acerola. 2002, da adaptação do livro de Paulo Lins, o filme Cidade de Deus, revela o ator Leandro Firmino no personagem de Zé Pequeno. 2007, o meu mano TR lança o livro Acorda Hip-Hop, contando as origens do Movimento Hip-Hop nos EUA e registra a importância da CDD neste contexto cultural em nossa cidade. Ou seja, decoramos a pagina cultural de arte e nossas crianças precisam saber disso”, enfatiza.

Amigo inseparável nas produções cinematográficas, Paulo Silva destaca a importância de Pecly até como inspiração para mentes notáveis como Marcelo Yuka:

“O Julio enfrentou o preconceitos de ser pobre, negro, favelado, cadeirante e com Distrofia Muscular de Duchennne (doença degenerativa). E, enquanto muitos por aí, plenamente sãos, ficam esperando cair do céu, ele se tornou escritor e roteirista. Fez vários filmes, dentre estes o “Enchente”, que conta a história de como a CDD sobreviveu em meio às fortes chuvas de 96. A luta dele o levou a ser roteirista na Rede Globo. E em sua simplicidade incentivou gênios como o Yuka a dar a volta por cima diante do impossível”, lembra emocionado.

Com lançamento previsto para o final do ano, CDD 50 Anos, conta com o protagonismo central do ator Leandro Firmino, o “Zé Pequeno” do filme Cidade de Deus e deseja causar, tanto no morador local, quanto no espectador em geral, o impacto visual capaz de revelar um bairro que pode em muito contribuir para a formação cultural de nossas gerações... Para mais informações acesse o Facebook oficial do Filme.